Foto: Josiane Albuquerque |
Lembro-me bem daquele dia. Uma quarta feira do mês de novembro, como poderia me esquecer? Na dita época cursava o nono ano do ensino fundamental. Recordo-me ainda que a mais de um ano já se falava da construção de um colégio de ensino médio, já que os alunos dessa localidade se destacavam constantemente no cenário estadual com aprovações em universidades e excelente desempenho nas avaliações externas. Da pra imaginar a euforia que eu e todos os meus colegas sentimos. Alunos que desde o pré-escolar conviviam com condições precárias de ensino, finalmente poderiam usufruir de uma infraestrutura adequada. Esperanças vãs... Minha turma deveria ser a primeira do novo colégio. Mas o que tudo indica é que nossa estada no mesmo não passará de um sonho. Nós que vimos tudo o que nossos conterrâneos passaram para estudar. No início, numa quadra dançante, expostos a sol e chuva, posteriormente espremidos em quartos e salas de uma casa particular, vítimas de ameaças de despejo devido à falta de pagamento do aluguel. Esses mesmos jovens humilhados eram os que elevavam o nome de nosso distrito aos altos patamares, sendo aprovados nos vestibulares. Mas se engana quem pensa que a partir dali o sofrimento acaba, pelo contrário. Sem transporte que os levasse a faculdade, nossos primeiros universitários se arriscavam em paus-de-arara por uma estrada buraquenta e cheia de poeira, isso no verão, no inverno, lama. Chegaram até mesmo a pegar carona em caçambas da construção civil, foram transportados também em caminhões de lixo da Prefeitura, sem contar que uma vez, diante de tanta chuva e da impossibilidade de atravessarem no dito pau de arara a ponte sobre o Rio Coreaú, foram de jerico. É válido ainda ressaltar que, por conta de a maioria dos universitários não terem votado no prefeito eleito da época, foram obrigados a pagarem cento e vinte reais para chegar à Universidade, (pois o transporte que era dado pela Prefeitura foi imediatamente suspenso, como forma de puni-los pela insubmissão). Sessenta é para o dito pau de arara, até Coreaú, e sessenta para o ônibus de Coreaú a Sobral. Tudo para não perder aula. Graças a esses alunos é que fomos contemplados com a construção de uma escola desse porte em nosso humilde distrito. Mas parece que o símbolo maior de nossas glórias estudantis foi tomado por interesses políticos individualistas. A obra que deveria terminar em cento e cinquenta dias, já passou de dois anos, sendo executada e nada de acabar. Para piorar, vários desastres já aconteceram. Uma das paredes de sustentação do ginásio caiu depois de uma ventania, o calçamento que dá acesso ao portão de entrada cedeu depois de uma chuvinha de verão e o sistema de circulação de ar foi instalado equivocadamente no teto das salas. Acentuando ainda mais o enredo de novela mexicana que essa construção se transformou, fomos assaltados. Passamos por greves e escassez de material para a construção. O resultado está aí, a inauguração nem aconteceu e o edifício já começa a se deteriorar com o passar do tempo. E agora onde estão os homens que há dois anos fizeram questão de subir no palanque para explicitar as suas respectivas participações na obra. Será que teremos que esperar alguma atitude do mesmo homem que declarou que os professores da rede pública devem trabalhar não por salários e sim por amor? Pois é, o tempo passa e enquanto os “padrinhos” ensaiam o discurso para as eleições que se aproximam, os alunos do anexo aqui de Araquém sofrem num ambiente completamente inadequado para a aprendizagem. Para agravar o quadro tudo leva a crer que o local onde estudamos (ou tentamos estudar) poderá não estar a nossa disposição para o ano que vem, pois haverá uma reforma na escola de Ensino Fundamental Santo Antônio e os alunos da mesma serão transferidos para a creche Santa Rita, lugar onde coincidentemente temos nossas aulas. E agora? Será que os caprichos políticos nos colocarão na rua? Será que, no ápice do desenvolvimento intelectual da humanidade, em algum lugar o interesse de uma minoria prevalecerá sobre a necessidade em comum de toda uma comunidade?
Erick Tabosa, estudante do 2º ano da EEM Flora de Queiroz Teles, Araquém
araquemnews
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